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domingo, 6 de novembro de 2011

Nara Leão - Crítica


Dizer que Nara Leão foi importante para a MPB pelo fato de ter sido a musa da bossa-nova é uma temeridade. Mais que isso, uma injustiça, além de falta de compostura histórica.

É claro que Nara foi musa, sim, e ninguém negará isso, ao menos nós que vivemos os anos dourados da bossa entre 1960 e 1964. Aliás, não apenas musa do mais poderoso movimento musical que existiu no Brasil. Mas até musa individualizada de quase todos nós, que caíamos de quatro ante a sedução sem par daquela franjinha, daquela boca carnuda, daquela voz grave ao falar, daquele par de olhos que encarava o interlocutor com uma firmeza capaz de demonstrar qualquer alma menos prevenida, um misto de luz celestial de anjo e raio dardejante de mulher sedutora. Sedutora? Muito, muitíssimo mais que isso.

Assim era Nara, que não queria ser musa de ninguém, e era, que não queria sequer que a chamassem de musa da bossa-nova, e era.

Mas muito além da musa jamais autodeclarada, estava um poderoso ser humano, dotado da melhor antena que registra a MPB. Nara Leão, com seu faro de perdigueiro para cheirar talentos novos, não apenas institucionalizou os compositores da bossa nova, na sua fase mais eloqüente, o comecinho dos anos 60, quando cantou Menescal e Bôscoli, Carlos Lyra, Vinícius e Tom. Nara, na verdade, foi muito mais longe. Teve a sensibilidade de abraçar os ideais de justiça social apregoados pelo CPC da UNE e pelo Cinema Novo, ouvir e deixar-se encantar pela magia dos poetas do morro, a turma mais ligada às escolas de samba, acusada de “quadradona” por certos setores da bossa nova.

Lembro-me do quase escândalo que foi o primeiro LP da Nara, gravado para a Elenco, de Aloísio de Oliveira. A cantora – de quem boa parte da crítica esperava apenas bossa e balanço, sol, céu, mar e azul, teve o topete de apresentar as visceralidades de Cartola (“O Sol Nascerá”, com Elton Medeiros) e Nelson Cavaquinho (“Luz Negra”, uma pura obra-prima de tensão e dramaticidade). Além de Zé Kéti, com o êxito triunfal que viria a ser “Se Alguém Perguntar por Mim”, samba antecipatório de “Alegria, Alegria” (de Caetano, quatro anos depois), inaugurando o Tropicalismo. Ricardo Cravo Albin



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